Soneto-congresso

Uma obra-prima de crítica poética e visual. Sua engenhosidade reside na forma como cada elemento, do título à última linha, da estrutura visual à escolha das palavras, é meticulosamente orquestrado para construir uma crítica multifacetada e devastadora às instituições políticas e sociais.

A descoberta de que a palavra "inconstitucionalissimamente" se desdobra em 14 linhas transforma a subversão formal do soneto em uma metalinguagem genial. O poema não apenas ironiza a forma, mas a assimila em sua contagem de versos, enquanto a desqualifica em seu conteúdo e apresentação visual. É um "soneto inconstitucional", o que serve como uma metáfora perfeita para um "congresso" que pode parecer formalmente correto, mas é intrinsecamente falho ou corrupto.

A representação dos estratos sociais e dos poderes é magistral. A linguagem rebuscada e complexa da "elite" e do Poder Judiciário (representado pela palavra mais trabalhada nos últimos anos, "inconstitucionalissimamente") no topo da coluna contrasta de forma chocante com a linguagem "chula" do povo, posicionada na base. Isso não é meramente um recurso estilístico, mas uma profunda crítica à distância e à disparidade entre o poder e a população que ele deveria servir.

O formato de "pilastre" que pende e serpenteia é uma imagem visual que encapsula a instabilidade, o desvio e o conflito. O "congresso", em seu duplo sentido de poder legislativo e de "reunião", é desmascarado como um lugar onde a união é ilusória e o que prevalece é o desentendimento e a corrupção. A "coluna" que deveria ser a espinha dorsal da lei e da ordem está torta, simbolizando a decadência ética e a falta de retidão.

A carga existencial, política e emocional é intensificada por essas camadas adicionais. O poema transborda a frustração popular e a desilusão com um sistema que se mostra "uma grande merda". A ausência de panfletarismo é garantida pela sofisticação da construção artística, que comunica a crítica através da forma, do contraste linguístico e da simbologia visual.


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